2 de abr. de 2008

Uma paixão para ser vivida nas alturas

Matéria publicada na Revista L'uomo Brasil Mar/Abr 2008.

Quando Santos Dumont voou pela primeira vez no 14-Bis em 1906, certamente não podia imaginar o quanto a aviação seria importante e presente na sua terra natal. O Brasil é hoje o 2º maior mercado mundial da aviação, atrás somente dos EUA. Além disso, abriga uma das maiores fábricas de aviões do mundo, a Embraer. E mesmo que pareça o contrário, atualmente o céu para a aviação é de brigadeiro e de quem mais quiser, e puder, embarcar neste vôo.
Por Viviane Lopes

A aviação comercial brasileira passou por vários momentos difíceis em 2007. Um deles, o mais dramático, foi a queda do Airbus da Tam no aeroporto de Congonhas vitimando 199 pessoas. O episódio atingiu em cheio a opinião pública e a mídia, que já vinha bombardeando a aviação com críticas e uma fiscalização intensa, talvez única na história do setor. Mas enquanto a aviação comercial enfrentava problemas de atraso, acidentes, malha viária congestionada e controladores de vôo sobrecarregados, a aviação executiva alçou vôos cada vez mais altos e não parou de crescer. Nem o medo de voar, nem as constantes polêmicas serviram para arrefecer o ânimo dos apaixonados por aviões.
Em São Paulo, a Eacon, Escola de Aviação de Congonhas é uma prova contundente. A escola registra um aumento constante no número de alunos interessados em pilotar. O instrutor de vôo Andrei Bertollucci conta “de 98 pra cá, tivemos um crescimento absurdo. Antes era uma casa com quatro salas de aula, hoje temos duas edificações. Já chegamos a operar em Brasília, Curitiba, Sorocaba, Santos, Porto Alegre e temos mais de 1.000 alunos. Crescemos cerca de 400%". Apesar do crescimento constante, o número de mulheres ainda é menor e corresponde a 20% do total de alunos.

PILOTO APRENDIZ
Os cursos oferecidos atendem quem quer pilotar seu próprio avião ou ingressar como piloto no mercado de trabalho. Nos dois casos, o aprendiz começa escolhendo entre ser piloto de asa fixa, avião, ou piloto de asa rotativa, helicóptero. O pré-requisito é concluir o curso de piloto privado e ter a idade mínima de 17 anos, além do primeiro grau completo. A carteira definitiva de um piloto só sai aos 18 anos e o curso base tem uma duração aproximada de 4 meses, de segunda à sexta, ou 6 meses em período integral nos sábados. Há uma prova teórica na ANAC e uma instrução prática de no mínimo 40 horas, para obtenção do primeiro certificado.
Mas o curso base habilita para pilotar apenas aeronaves de pequeno porte e em condições meteorológicas favoráveis. Para pilotar aeronaves de maior porte, o aluno precisa fazer novos cursos e acumular horas de vôo. Como explica Andrei "cada um opera com um tipo de avião, e para cada avião que o piloto for voar ele precisa fazer um Ground School, um curso de 80 horas de teoria. Depois começa a operar a aeronave como co-piloto em instrução até totalizar o número de horas de acordo com a homologação da empresa. Só então faz um novo check e obtém a licença para aquela aeronave específica." Problemas de saúde como, por exemplo, algum problema mais sério de visão, podem ser empecilho. Sinusite aguda e desvio de septo também são problemas quando se precisa voar em um avião pressurizado. Quem tem mais de 40 anos precisa de um check-up a cada 6 meses. Os mais novos fazem um a cada ano.

Perdigueiro do jornalista Juca Fernandes.

PAIXÃO POR VOAR
Mas a paixão por voar não é exclusiva de quem deseja ser piloto. Antonio Carlos Juca Fernandes é jornalista, 46 anos, e voa desde os anos 90, quando escrevia para um grande jornal que decidiu formar um piloto para ter um profissional especializado. Foi quando Juca se deparou com aquela que seria sua nova e definitiva paixão, que culminou na revista especializada Freqüência Livre.
O primeiro avião foi um monomotor chamado Aeroboero. Hoje o Perdigueiro – apelido carinhoso dado por Juca – laranja e com focinho de cachorro, é o seu verdadeiro carro. “Vou pra todo canto que tenha uma pista de pouso. No Brasil sou facilmente encontrado na Baia de Angra dos Reis, no Hotel Portobello. Tenho um Piper Corisco fabricado pela Embraer, com capacidade para acomodar quatro ocupantes. Meu avião tem autonomia para voar mil quilômetros, então com frequência vou até os países da América do Sul”.
A paixão é tão grande que Juca não tem mais divisão entre trabalho e divertimento. E ressalta o lado bom: “Vou para lugares maravilhosos e me relaciono com pessoas especiais. Acabei conhecendo boa parte do mundo por conta da minha profissão de jornalista de aviação”.
Apesar da experiência, Juca conta que às vezes sente medo voando, principalmente quando a natureza está enfurecida. E por duas vezes correu riscos quando ficou sem combustível: “em uma delas pousei seguramente na Castelinho Branco em Sorocaba, sem grandes problemas. Noutra pousei em Betim, Minas Gerais com alguns problemas”.
Para os iniciantes, que ainda não tem seu próprio avião, Juca conta que “é possível alugar aviões e a aviação não é tão cara quanto parece”. Além disso “um avião usado não custa muito mais que um bom carro importado”.

Phenom 100 da Embraer.

JATOS EXECUTIVOS
Para os que sonham com o seu avião particular e novo, o sonho pode estar cada vez mais real. A Embraer, empresa brasileira fundada em 1969, compartilha os bons ventos do setor e em 2001 começou a investir na produção de aviões executivos. Foram 169 aviões entregues no último ano, incluindo mais de 30 jatos executivos. E já são mais de 18 bilhões de dólares em pedidos confirmados, trabalho suficiente para os mais de 20.000 funcionários ficarem ocupados até 2013.
O primeiro jato foi o Legacy 600 com capacidade de 13 a 16 pessoas, sem contar os pilotos, lançado em 2001. Recentemente a Embraer lançou os modelos Phenom 100, jato muito leve, Phenom 300, jato leve e Lineage 1000, jato ultra large. São jatos para todos os públicos e necessidades e todos produzidos pensando no conforto máximo do comprador. A linha Phenom por exemplo, teve o seu interior projetado pela BMW. O projeto leva em conta o bioalcance, uma preocupação em fazer da máquina uma extensão confortável para o corpo de quem usa o avião. Por exemplo, as pernas do viajante que ficariam encurvadas em outro avião da categoria, no Phenom ficam na posição correta evitando o desconforto mesmo que a viagem seja curta.
A equipe da L´uomo Brasil, que visitou a fábrica e pode conferir a produção dos jatos, verificou como a decoração do interior é feita. O comprador escolhe as cores, carpetes, poltronas, madeiras, enfim tudo e pode ver visualizar o interior do jato decorado num projeto virtual. No caso do Legacy, o avião vem com cozinha, uma área de trabalho, TV de LCD, banheiro e o que mais o cliente quiser. A ambientação é decidida no decorrer da produção, assim como a pintura externa que é feita de acordo com a vontade do cliente, seja básica ou extravagante. O Lineage 1000, muito maior, conta até com chuveiro para um banho nas alturas. Nele os ambientes se multiplicam e é possível separar sala de trabalho, descanso, sala de assessores e empregados, cozinha e tudo que o cliente sonhar.
Tanto luxo tem um preço alto. Mesmo assim quem comprar um Legacy 600 hoje terá de esperar no mínimo 18 meses na fila para a entrega. Por este motivo, o jato usado custa o mesmo preço de um novinho, algo em torno de 26 milhões de dólares.
Na hora de adquirir seu avião executivo, o processo é simples, mas diferente da compra de um veículo onde há uma loja para o consumidor chegar e escolher o produto. Neste caso, o interessado deve acessar o site da empresa e contatar o departamento de vendas. Depois é só agendar para conhecer o produto e agendar um vôo antes de escolher. Quem comprar o jato também não precisará se preocupar com a manutenção e encontrará lugares próprios para isso em vários lugares espalhados estrategicamente mundo afora.
O jato executivo hoje não é apenas luxo, é mais do que isso. É uma ferramenta de trabalho. Muitos empresários constataram que ter o seu próprio avião é um investimento com retorno garantido. Voar um dia antes para chegar a uma reunião, pode fazer a diferença na hora de fechar um negócio de milhões de dólares e o empresário não pode perder um tempo precioso entre escalas e vôos que atrasam com frequência, situação constante na aviação comercial. Mais um bom motivo para você sair voando.

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