29 de set. de 2008

A democratização do luxo.

Matéria publicada na Revista L'uomo Brasil Setembro/Outubro 2008.
Ele é um dos mais conhecidos e respeitados filósofos da atualidade. Estudou filosofia na Sorbonne, foi ativista dos movimentos que culminaram em maio de 68, publicou livros, ajudou a reformar o ensino de filosofia na França e é professor na Universidade de Grenoble. O francês Gilles Lipovetsky acompanhou as mudanças da sociedade e estuda temas contemporâneos como publicidade, lazer, consumo, moda e luxo. Polêmico, já criticou a Daslu, mas apóia um luxo inteligente, um luxo democratizado.
Por Viviane Lopes
Com colaboração e tradução de Marie-Océane Gazurek

Ao contrário do que muitos acreditam, Gilles Lipovetsky não condena o luxo. Ele busca entendê-lo como fenômeno contemporâneo. Lipovetsky esteve no Brasil em agosto, para o Com:atitude 2008, um seminário sobre atitude de marca. Em entrevista exclusiva à L'uomo Brasil, falou sobre consumo, mudanças do consumidor, luxo e suas motivações para estudar o assunto.
FASCÍNIO: O mundo no qual vivemos fez do luxo um fenômeno considerável. O desenvolvimento das marcas de luxo no mundo inteiro, o espaço que elas tomaram, tudo isso me fascina e por isso tenho interesse intelectual em entender o que está acontecendo.
LUXO: Nos anos 60, os jovens da contracultura consideravam o luxo uma aspiração burguesa. Hoje o cenário é muito diferente: jovens de 12, 13 anos, pedem o luxo, as meninas querem uma bolsa Dior, um batom. Isso traduz uma mudança em relação ao consumo e à moda. A nova relação com o luxo, de alguma maneira, é sinal do fim da cultura da contestação.
HEDONISMO: O que era dominante na sociedade de consumo clássica, do pós-guerra, era uma lógica de consumo semicoletiva, fundada no equipamento, o lazer, a família. Essa sociedade dos anos 1950 acabou. Uma nova sociedade de consumo estabeleceu-se. Estamos em um novo estado do capitalismo de consumo, que eu chamo de "sociedade de hiperconsumo" e o consumidor que vive nesta sociedade é um 'hiperconsumidor'". As famílias que antes tinham um carro, uma televisão, mudaram. Hoje, o consumo é cada vez mais focado no indivíduo e, consequentemente, as famílias tem mais carros, eletrônicos, telefones. A sociedade de consumo clássico favoreceu o individualismo pelo hedonismo.
CULTO ÀS MARCAS: Grandes marcas como Dior, Louis Vuitton, Calvin Klein, são poderosas e substituíram um papel importante de agregação. As hipermarcas são conhecidas em todos os continentes e além do marketing tem outro elemento a seu favor: a insegurança do consumidor. As pessoas eram criadas em meios sociais muito claros. Hoje todo mundo está perdido, não há mais culturas coletivas. A marca tem aí o seu papel, ela traz segurança ao hiperconsumidor perdido na hiperescolha da mercadoria. Quando a moda não tem mais sentido como outrora, a marca reconforta o consumidor. Hoje há um verdadeiro culto às marcas.

O new luxury é uma contradição, pois o luxo nunca foi para a massa! O que vira o luxo quando é para a massa? Hoje, por exemplo, os americanos falam de new luxury, que Starbucks é new luxury! Para um francês, isto não é possível!

NEW LUXURY: O aumento do consumo de luxo impressiona. O número de pobres é considerável, mas o número de gente rica, e muito rica, está ficando cada vez maior. São milhões de pessoas que tem fortunas consideráveis. De um lado você tem o aumento do que se chama o hyperluxo, os barcos, os helicópteros. De outro, um tipo de new luxury, ou o luxo para todo mundo. Você vai à uma loja Louis Vuitton e tem coisas que não são caras demais, umas eaux de toilette.
TOTAL LOOK: As decisões de compra dependem menos de critérios de classe do que de idade, sexo, critérios pessoais e eclécticos. Hoje se fazem compras caras em um lugar e econômicas em outro. Uma mulher de manhã compra uma camiseta na Zara e de tarde uma bolsa na Gucci, é o fim do total look. É até chique comprar coisas que não são do mesmo nível econômico, pois assim mostra que se é um consumidor inteligente.
LUXO NO BRASIL: As diferenças culturais são grandes. O consumidor europeu é mais emocional, experiencial, hedonista. Já no Brasil, Gilles acredita: “que ainda tem um consumo ostentatório. Na China, a lógica é totalmente ostentatória. Afinal, estes são países que estão saindo da pobreza.
DASLU: Não sou um moralista. O luxo tem algo de chocante. Tanta riqueza do lado de gente que não tem nada, isto é chocante com certeza. Mas há tantas coisas chocantes! A partir do momento em que há riqueza, tem gente que gasta dinheiro, isto não é o problema. Mas acho que estas lojas podem trazer alguma coisa. Não sou contra as lojas de luxo. Acredito que exista uma elegância.
LUXO INTEGRADO: Em Paris não é chocante. Voce vai ao Boulevard St. Germain, Avenue Montaigne, e tudo está integrado em um quadro. Mas inserir um universo de luxo em um universo de extrema pobreza, acho que é esteticamente de mau gosto. O verdadeiro gosto seria fazer como os romanos, ter um luxo público, transformar os arredores, plantar árvores. O luxo não deveria ser simplesmente para o consumo particular, poderia ser, e podemos sonhar com isto, uma tomada em consideração ao espaço público. Não se trata de dar o luxo para às pessoas, mas simplesmente para que o luxo não apareça como um universo de egoísmo absoluto.
SUSTENTABILIDADE: Cada vez mais se observa consumidores que compram produtos éticos, solidários. Ecologia, desenvolvimento sustentável e respeito ao meio ambiente, parecem sensibilizar um número crescente de consumidores. O consumidor de hoje é informado, tem medo do futuro e faz do seu consumo uma questão de referência social. Quando a política e a religião são menos produtoras de identidade, o consumo pode assumir este papel para um certo número de pessoas. Devemos parar de diabolizar o mundo do consumo, que tem muitos defeitos, mas que não aboliu felizmente o altruísmo, a moral e a indignação.

Para saber mais
O Luxo Eterno: Da Idade do Sagrado ao Tempo das Marcas - Gilles Lipovetsky

26 de set. de 2008

Vivere!

Matéria publicada na Revista L'uomo Brasil Setembro/Outubro 2008.
O novo DVD do cantor Andrea Bocelli, acaba de ser lançado no Brasil e reúne tudo que é necessário para fazer sucesso. A música Vivere - Dare to Live, que Andrea interpreta ao lado de Laura Pausini, além de emocionante e tecnicamente perfeita, poderia bem ser a trilha sonora deste cantor que sempre ousou viver com plenitude.
Por Bianca Moretto

Andrea nasceu em Lajatico, área rural de Toscana, e ainda era um bebê quando os familiares perceberam que havia algo errado com os seus olhos. Não tardou para que os médicos descobrissem que se tratava de um glaucoma congênito e que, gradualmente, Andrea perderia a visão. Foi o que aconteceu quando ele tinha apenas 12 anos de idade. No entanto, isso não impediu a descoberta precoce da música. Sua mãe, Edi Bocelli, contou em recente entrevista à BBC, que, certa vez estava escutando uma peça de Franco Corelli no rádio e notou que Andrea, ainda criança, estava atônito ao seu lado. “A vida não poupou meu filho nem da alegria nem da dor”, disse Edi.
Em entrevista exclusiva a L’uomo Brasil, Andrea disse que gosta de pensar no canto como uma “disciplina agonística” (do latim agonisticu, significando a arte da luta, na antiga Grécia), onde o treinamento e a submissão voluntária levam ao aperfeiçoamento da própria técnica.
“O canto e a manutenção da própria vocalidade não podem prescindir de um exercício quotidiano e de uma constante atenção com a própria condição física. Ultimamente os inúmeros compromissos de trabalho me impedem de ter aulas, mas até hoje guardo como um tesouro os ensinamentos dos professores que tive a sorte de conhecer. Todos os dias, mesmo quando estou em viagem, dedico diversas horas ao estudo das obras que me chamam para gravar ou para interpretar ao vivo”.
A verdade impressa na voz de Andrea Bocelli conquistou pessoas em todos os cantos do mundo. Ele já se apresentou em mais de 30 países, e vendeu cerca de 60 milhões de cópias. O seu sucesso é ainda mais impressionante se levarmos em conta que este talento era praticamente desconhecido até os 34 anos de idade. Antes disso, atendendo ao pedido de seu pai, Andrea foi estudar direito em Pisa e voltou para casa com o título de doutor.
Foi um rock star italiano quem o apresentou ao mundo. Zucchero precisava de um tenor para gravar um CD demo e convencer Luciano Pavarotti a fazer um dueto. Quando Pavarotti escutou a voz de Andrea, disse: “Mas por que você está me convidando? Este tenor é melhor do que eu”.
Luciano gravou a música Miserere, que rapidamente se transformou em um grande sucesso internacional. Mas foi Andrea quem a interpretou ao vivo ao lado de Zucchero em um tour pela Europa. Daí em diante, o mundo se apaixonou pela “voz com lágrimas”, como descreveu o maestro Franco Corelli.

CANTAR COM O CORAÇÃO
Andrea tem dois filhos do seu casamento com Enrica. Atualmente está divorciado e namora a bela, e também italiana, Verônica. O casal mora em Toscana, em um antigo hotel que reformaram para ser o seu novo lar. Ali a música se faz presente em todos os ambientes. E não poderia ser diferente.
“A música é parte fundamental da minha vida e me diverte tocar um pouco de todos os instrumentos, desde percussão até aos de sopro, flauta em particular. Obviamente o piano é um importante auxílio para o estudo da técnica vocal e, portanto, o instrumento que prefiro e que toco mais”.
O tenor transita livremente entre três estilos musicais: pop, ópera e música clássica. “O que conta é cantar com o coração, transmitir para quem escuta uma mensagem de arte e o prazer de uma audição. Porém o conhecimento e o estudo da técnica vocal produzem a execução, seja esta operística ou popular, coerente com a interpretação do trecho. Se, no entanto, provocam evidentes diferenças técnicas de impostação vocal, não creio que um modo de cantar exclua o outro. A maior parte dos tenores canta indiferentemente música popular ou ópera. A razão disso está no fato de que existem trechos populares e mesmo canções populares que já podem ser incluídas entre os clássicos. Seja pela sua intrínseca beleza melódica ou pelo empenho vocal necessário no ato da execução. Esta é a razão pela qual acho interessante e até prazeroso propô-las nas minhas performances” – disse ele.

Em meio às colinas tranquilas de Lajatico, o Teatro del Silenzio comporta até oito mil pessoas.

ENCONTRO PERFEITO
Entre os tours mundiais, que incluem um especial para o Papa João Paulo II e uma homenagem às vítimas do World Trade Center, Andrea voltou para casa e juntou forças com amigos, investidores e produtores, para construir um teatro inédito no mundo, o Teatro del Silenzio. Em meio as colinas tranqüilas de Lajatico, surgiu um teatro ao ar livre que comporta até 8 mil pessoas. Foi neste cenário, inaugurado em 2006, que o tenor gravou o DVD Vivere - Live in Tuscany. O espetáculo ficou completo com a participação de grandes estrelas da música como Heather Headley, Sarah Brightman, Laura Pausini, Kenny G, Chris Botti, o extraordinário pianista chinês Lang Lang, a cantora italiana Eliza e o produtor e compositor, vencedor de 14 Grammy Awards, David Foster. Um encontro perfeito.
“Eu estava em casa, entre a minha gente, com tantas pessoas vindas de todas as partes do mundo e a emoção de voltar às origens no meio daqueles odores de terra arada e vinhas. Em pleno verão, o úmido da tarde que aplaca o calor do dia. Enfim, uma emoção difícil de contar, mas tão intensa, prazerosa e capaz de deixar a mais doce das recordações”.
Andrea ressalta que dentro de uma produção há sempre um importante trabalho de muitas pessoas. Empenho que dura às vezes meses ou mesmo anos, e que nos dias de hoje, com tantas tecnologias a disposição, chegam a níveis de perfeição do som verdadeiramente inimagináveis até pouco tempo atrás.
“É um mundo que evolui e se especializa e está em contínuo progresso, para tornar sempre mais agradável e com mais qualidade, a música que entra nas nossas casas. No caso de Vivere, que se trata de um apanhado de trechos que executei ao longo dos anos, o elenco de colaboradores é ainda mais prestigioso, porque compreende uma grande parte dos artistas e produtores com os quais tive o prazer de colaborar no curso da minha carreira”.

ANDREA ESTEVE NO BRASIL HÁ ALGUNS ANOS E DIZ QUE ESPERA VOLTAR O QUANTO ANTES, DEVIDO ÀS CONTÍNUAS E FREQUENTES DEMONSTRAÇÕES DE ESTIMA QUE RECEBE.

“Será uma grande honra e um imenso prazer reencontrar o público brasileiro a quem dedico Vivere. Com certeza, no imaginário coletivo de nós italianos, o Brasil está associado à música com M maiúsculo. Somos fascinados desde sempre pelo calor e pela simpatia de um povo amigo, que se exprime com talentos musicais extraordinários. Crescemos cantando o inesquecível Antônio Carlos Jobim, Chico Buarque de Hollanda, Roberto Carlos, Toquinho e todos os grandes e verdadeiros clássicos da canção internacional. Ouço com paixão Gilberto Gil, também importante político, Caetano Veloso e outros ainda que não cito, mas nem por isso são menos importantes, e com os quais faria duetos com prazer”.
Andrea Bocelli, aos 50 anos, ousa viver intensamente. A sua deficiência visual não o impediu de ter uma infância feliz, de andar de patins, praticar mergulho com os seus filhos, passear de bicicleta com a namorada e muito menos, de domar o seu próprio cavalo. Andrea atua em óperas com a mesma naturalidade com que vive o seu dia-a-dia.
“Tenho muitos projetos para o futuro, que espero realizar com o mesmo empenho. Este é o único instrumento para realizar os sonhos, para dar corpo aos nossos desejos e para concretizar aquele projeto na origem do qual nos pôs a providência”.

8 de ago. de 2008

Paulo Szot: um brasileiro conquista a América.

Matéria publicada na Revista L'uomo Brasil Julho/Agosto 2008.

O menino que tinha medo de ouvir ópera cresceu e, por ironia do destino, se transformou em barítono. Depois de cantar em sessenta produções, nacionais e internacionais, Paulo Szot entra para a história como o primeiro brasileiro que conquistou um Tony Award, o principal prêmio do teatro americano. O mais novo darling dos palcos americanos agradeceu pelo prêmio em português e dedicou o troféu à sua mãe.
Por Bianca Moretto e Viviane Lopes

Filho de poloneses que migraram para o Brasil no pós-guerra, trazendo apenas a roupa do corpo e a paixão pela música e pelas artes, Szot tinha como brinquedo predileto na infância uma vitrola. “Eu ficava ouvindo música clássica e olhando as nuvens dançarem no céu. Sempre fui contemplativo, e continuo assim”. Incentivado pelos pais, Szot freqüentou a escola de música desde cedo.
Na adolescência, piano e violino já faziam parte da sua vida. Mas, foi aos dezoito anos que grandes mudanças começaram a acontecer. O Consulado polonês em São Paulo, estava oferecendo bolsas de estudos. Depois de ser reprovado no vestibular para medicina, Paulo se aventurou com um amigo de escola que tinha a mesma necessidade de conhecer o mundo.
“Embarcamos num navio cargueiro no porto de Vitória e após 23 dias estávamos em solo polonês. A Polônia comunista não era tão atraente para um adolescente de 18 anos. Foi difícil me acostumar, mas depois de alguns meses já havia descoberto um mundo que parecia impossível de existir.”
“O apoio às artes, música e dança era incrível! Logo conheci jovens que tinham os mesmos ideais e sentia que me identificava cada vez mais com o país e sua cultura. Apesar das dificuldades do dia-a-dia, a felicidade de encontrar um lugar onde eu poderia ser um “artista”, fazia desaparecer as diferenças que no princípio pareciam invencíveis. O Brasil não tem tradição em ópera, portanto, não temos uma escola brasileira de canto lírico. Para mim, foi indispensável ingressar no mercado internacional. Não existem regras, mas é sempre bom para o artista expandir seus conhecimentos para se tornar um profissional com diferentes experiências não só de trabalho, mas também de vida.”.
Depois de passar oito anos trabalhando como cantor na Polônia, Paulo percebeu que estava na hora de voltar para casa. Foi então que conheceu Luciano Pavarotti no Rio de Janeiro, durante as audições do renomado Concurso Internacional de Canto, um divisor de águas em sua vida. Szot foi à Filadélfia a convite do tenor para participar da Final Mundial em 2005.
“Foi o primeiro contato que tive com outros cantores da minha geração. Depois dessa experiência voltei ao Brasil, ingressei no Coral do Teatro Municipal de São Paulo, no qual, tive o prazer de conhecer o maestro Luís Fernando Malheiro. Foi ele quem ofereceu o meu primeiro papel-título”.
Paulo também foi dirigido por Gerald Thomas na pocket ópera NXW. Ele cantava um hit operístico escrito para um soprano, A morte de Isolda. "Funcionou muito bem. Eu gostei. A companhia era fantástica assim como o irreverente Gerald. Sinto saudades de todos!”.
Szot está há seis meses em cartaz no Lincoln Center, com South Pacific, onde ficará até o final do ano. Em entrevista exclusiva à L’UOMO BRASIL, ele disse: “A equipe é fantástica. Sempre muito educados e profissionais. Desde a primeira audição foram muito gentis e solícitos comigo. O Diretor de casting acertou na mosca! Não consigo imaginar um elenco mais bem entrosado do que este aqui”.
Depois da estréia não existem mais ensaios: “A concentração é total para os shows e todos chegam preparados para se apresentar 30 minutos antes do espetáculo. No Brasil é costume fazer aquecimento e vocalizes em conjunto antes do show. Aqui não existe nada disso. Cada um tem sua própria maneira de se preparar, eles respeitam e confiam nos profissionais que contratam. É assim que sempre deveria ser. Mais uma vez o Brasil deveria olhar para o centro dos musicais e adotar, ou melhor, dispensar métodos que só cansam o artista. É obrigação de cada artista se aperfeiçoar e para isso deve buscar professores na maioria das vezes fora do local de trabalho. É assim que funciona na ópera, e também aqui na Broadway”.

SEDUTOR SOLITÁRIO
Em South Pacific, onde Paulo interpreta o sedutor Emile de Becque, fazendeiro francês que mantém um romance com uma enfermeira americana (Kelli O'Hara), são oito shows por semana. Enquanto na ópera ele estava acostumado a fazer apenas três apresentações semanais. Mas as diferenças não param por aí. Na ópera os cantores nunca usam microfones e precisam estar muito descansados vocalmente para executar o papel. Segundo ele “a compreensão das diferenças entre os dois estilos é essencial para o sucesso”. Szot está arrancando suspiros da platéia, mas disse que não sobra tempo para a vida sentimental. “Não tenho tempo, procuro me manter em forma para agüentar a maratona dos oito shows por semana. Também gostaria de ter mais tempo para correr no Central Park”.
Depois de receber o prêmio das mãos de Lisa Minnelli e chamar a atenção da mídia em diversos continentes, Paulo está preparado para as mudanças que estão por vir. “De repente o mundo começa a enxergar quem você é. No meu caso venho cantando ópera durante 11 anos, cantei em mais de 60 produções em diferentes continentes, mas depois desse prêmio tudo toma outra dimensão. É bom ser reconhecido pelo trabalho de vários anos. Quero curtir muito esse momento”.
O público brasileiro vai ter que esperar para vê-lo por aqui. “Eu adoro me apresentar no Brasil, mas para o futuro próximo estarei aqui nos Estados Unidos e na Europa”.
Aos 38 anos, Paulo, não acredita que o momento plena satisfação exista. “Acho que provavelmente, para o artista, chega o momento onde ele percebe que já disse tudo aquilo que poderia dizer, então ele descansa. Eu penso no presente e em realizar tudo o que me propus a fazer da melhor forma possível, mas com certeza, esse novo caminho que estou percorrendo me mostrou que tenho muito ainda por descobrir e fico feliz em saber que existem muitas outras possibilidades."
Sergio Casoy faz parte de uma minoria que trabalha para registrar a presença deste estilo musical no Brasil. Em São Paulo, a partir de dezembro deste ano, Sergio e Heraldo Marin, que é diretor da Editora Algol, começarão a produzir um livro-cd. Nele, 25 dos melhores cantores brasileiros da cena lírica da atualidade, gravarão trechos de ópera que cantaram em palcos paulistanos.
“Antigamente, as vozes tinham o privilégio absoluto. Hoje, evidentemente, continuam sendo importantíssimas, mas tanto crítica quanto público atentam muito para detalhes da produção teatral, cenários, movimentação cênica. Outro aspecto, é que nunca vi, pelo menos no Brasil, tanta gente jovem, geração entre 20 e 30 anos, freqüentando o teatro lírico. Esse pessoal tem a cabeça mais aberta para qualquer tipo de repertório, aceita mais a ópera contemporânea cantada em quaisquer outros idiomas, pois hoje há legendas que permitem entender o que se está cantando”, explica Sergio.
Entre os destaques brasileiros, Sergio cita “o tenor lírico Fernando Portari; o soprano lírico Rosana Lamosa; o tenor lírico-spinto Marcello Vannucci; os mezzo-sopranos Denise de Freitas, Luciana Bueno e Adriana Clis; o soprano dramático Celine Imbert; o soprano lírico Claudia Riccitelli e o barítono Sebastião Teixeira.
“São apenas alguns dos muitos nomes importantes temos por aqui e que, evidentemente, não esgotam o assunto”, diz ele.
Sergio acompanha a carreira do barítono Paulo Szot, que momentaneamente deixou a ópera para brilhar na Broadway, desde que ele voltou da Polônia.
“Ele é um bom amigo, cheguei a apresentar alguns concertos com vários cantores dos quais ele fazia parte. Lembro-me muito bem de sua estréia em ópera completa na cidade de SP, num Barbeiro de Sevilha no Teatro Paulo Eiró, lá em Santo Amaro, sob direção cênica do grande cantor italiano Enzo Dara.
Sua primeira vez no palco do Municipal foi como Morales, personagem secundário na Carmen de Bizet, em 98; ele voltaria ao mesmo palco em 2002 na mesma ópera como Escamillo, o toureiro, agora uma das partes principais. A partir de uma Bohème do Teatro Alfa em novembro/dezembro de 98 com Portari e Lamosa, começou a ascensão de sua carreira, sempre em papéis principais.
Szot é sempre um cantor elegante, e um bom artista em cena, cuida muito do físico e se movimenta muito bem. Escolhe bem seus papéis sob o ponto de vista vocal, errou pouquíssimas vezes nesse aspecto. Críticas positivas, como as publicadas recentemente no NY Times, e o prêmio como melhor cantor de musicais da Broadway, em 2008, estimulam o cantor e chamam a atenção do mercado. Ainda mais quando o prêmio é merecido, como no caso do Paulo”, finaliza Sergio, que pesquisa música lírica há 35 anos.

7 de ago. de 2008

Obras de arte que agradam os olhos e o olfato.

Matéria publicada na Revista L'uomo Brasil Julho/Agosto 2008.

Quantos museus possuem em sua coleção mais de 5.000 obras? Certamente poucos e dentre eles, um museu nada convencional. Em Barcelona, o Museu del Perfum mostra através dos frascos a importância do perfume. E prova como a embalagem pode ser tão importante quanto o conteúdo.

Por Bianca Moretto e Viviane Lopes

Uma das centenas de criações de Pierre Dinand.

Inaugurado em 1961, o Museu del Perfum possui desde antigos frascos egípcios, gregos, romanos, árabes e de outras culturas, até criações de perfumistas atuais. Para se ter uma idéia da importância de um museu como este, ele não é o único no mundo. Existem museus do perfume nos Estados Unidos, na França, no Japão e até no Brasil. Em Curitiba temos o Espaço do Perfume, com mais de 600 peças.
Desde a pré-história, o perfume acompanha a trajetória do homem. Acredita-se que um odor agradável foi notado pela primeira vez, quando o homem sentiu uma fumaça perfumada saindo de uma fogueira. Por isso a palavra perfume deriva do latim per fumum, ou pela fumaça. Depois da descoberta, o homem começou a queimar madeiras e folhas aromáticas para os seus deuses e para si mesmo, e não parou mais.
A indústria do perfume fatura bilhões de dólares no mundo todo, mas a fragrância não é a única responsável pelo sucesso. As embalagens são desenvolvidas como verdadeiras obras de arte que traduzem a essência da fragrância visualmente. Um frasco carrega valores emocionais que encantam, seduzem e comunicam a personalidade do perfume que contém.
O francês Pierre Dinand, 77 anos, é o maior perfumista da Europa e tem mais de 500 frascos criados. Com uma ala exclusiva no Museu do Perfume do Japão, ele já venceu mais de 30 vezes o prêmio de melhor design do FIFI Award, a premiação máxima do perfume.
Em entrevista à Luomo, Pierre afirma que “para fazer sucesso e vencer, um perfume precisa de 5 elementos: design, conteúdo, marketing, distribuição e investimento. Se um deles falhar, você perde.”
Formado em Arquitetura, Pierre já criou para Azzaro, Dior, Givenchy, Paco Rabanne, Calvin Klein, Yves Saint Laurent, Dolce Gabbana e muitas outras grifes famosas. Inclusive para as marcas brasileiras O Boticário, L’acqua di Fiori e Natura. Segundo Pierre “o gosto brasileiro é muito parecido com o francês”. Dentre as suas criações preferidas, ele destaca os perfumes Opium, Pleasures, Calandre, Givenchy, Moschino, Azzaro e Eternity.
No Brasil, a Natura busca desenvolver embalagens com menor impacto ambiental, mas nem por isso menos atraentes em estética e funcionalidade. Prova disso é o projeto Perfume do Brasil. Com simplicidade e inovação, conseguiu expressar tão bem a marca genuinamente brasileira Ekos, que ganhou prêmios internacionais.

Pierre Dinand: o maior perfumista da Europa.

COMPLEXIDADE
Criar uma nova embalagem não é simples. Renato Nishimura, diretor da M Design, empresa especializada no desenvolvimento de embalagens, reafirma a complexidade da tarefa: “A fragrância é a alma do perfume e a expressão olfativa da sua personalidade. Ela nos transporta no tempo e no espaço através da lembrança de pessoas em momentos e lugares. A criação de uma embalagem de perfume só começa depois que o designer conhece essa personalidade, a do seu público, e o que ele deseja.”
A M Design, que já desenvolveu as linhas Egeo, Extreme, Florata in Rose e Carpe Diem para O Boticário e a coleção Mulher e Poesia para a Avon, cria embalagens para todo tipo de produtos. No caso específico dos perfumes, Renato ressalta: “O desafio é muito grande, o designer precisa conhecer o processo de fabricação e as limitações de cada material. Ele tem que estimular seu próprio lado emocional, buscar referências dentro de si e na diversidade humana e entender o público para quem vai criar. Senão corre o risco de criar para si mesmo.”
A criação pode ser muito subjetiva. Pierre conta: “Em 1968, Paco Rabane queria mostrar um casal fazendo amor em um carro e isso poderia ser de muito mau gosto, então propus mostrar a grade de um carro grande como o Rolls Royce.” Foi então que surgiu o design do Calandre.
Às vezes, como neste caso, o nome da fragrância surge com o nome do frasco. Pierre, que costuma esculpir a sua criação primeiro em material plástico, em 1980 esculpiu o frasco de Ivoire em um pedaço verdadeiro de marfim. Por isso Pierre Balmain decidiu chamar o perfume de Ivoire.

Moschino, um dos trabalhos preferidos do perfumista.

2 de jun. de 2008

O boom do cinema brasileiro!

Matéria publicada na Revista L'uomo Brasil Maio/Junho 2008.

Com tantos filmes vindos de Hollywood, sobra pouco espaço nas salas de cinema para as produções nacionais. Mas com o aumento da variedade de gênero e estilo de filmes brasileiros, a disputa está cada vez mais acirrada. Segundo o cineasta e diretor do site Filme B, Paulo César Almeida, “são lançados 80 filmes brasileiros por ano e parte desse sucesso deve-se a Lei do Audiovisual”. Desde que ela foi aplicada “já se revelaram cerca de 100 novos cineastas, com sucesso nacional e internacional”. Os números confirmam, os bons tempos do cinema brasileiro estão de volta.
Por Bianca Moretto e Viviane Lopes

Quem não viu Will Smith na festa de lançamento do seu filme no Rio de Janeiro, beijando o display com a foto em tamanho natural da atriz brasileira Alice Braga? A imagem supria a ausência da sua talentosa colega de cena no filme “Eu Sou a Lenda. Enquanto isso, ela estava atuando em outro longa-metragem no exterior. Will contou em diversas entrevistas que no momento em que viu Alice no longa brasileiro Cidade de Deus afirmou: ”Vou trabalhar com essa menina”, e não poupou elogios.
O Brasil é um celeiro de novos talentos nas mais diversas funções. Fernando Meirelles, Cao Hambúrguer, Walter Sales, Breno Silveira, Rodrigo Santoro, Fernanda Torres, Marília Pera, Selton Mello e muitos outros profissionais já receberam aplausos em grandes festivais no exterior. No entanto, ficamos longos anos com a produção escassa, o que gerou descrédito.
“Existe um preconceito do brasileiro com o próprio cinema brasileiro. Até reconquistar o público demora”. A frase é de Bruna Lombardi que já acumula 100 mil espectadores com o filme O Signo da Cidade. O longa-metragem foi lançado apenas em São Paulo e no Rio de Janeiro. Agora a equipe se prepara para exibi-lo em outros estados do país.
Filha de um diretor e de uma atriz, Bruna afirma ser cinéfila desde menina. Para se dedicar ao cinema, a roteirista, produtora e atriz, optou por não renovar o seu sólido contrato com a Tv Globo. Radicada em Los Angeles há cerca de 20 anos, Bruna é reconhecida por seus diversos papéis em telenovelas e pelo programa em que entrevistou personalidades como Dustin Hoffman e Jean-Claude Van Damme.
Ela comemora a sua sintonia com as telonas justamente em um momento promissor para o cinema brasileiro. Uma iniciativa inédita garantiu salas lotadas em todas as sessões de lançamento do seu filme. Na ocasião do aniversário de São Paulo o ingresso para assistir O Signo da Cidade custava apenas R$ 1,00.
Ainda assim, “é impossível que um filme se pague só com a bilheteria. Não apenas o cinema brasileiro, mas nenhum cinema no mundo. Salvos Hollywood e Coréia, com os seus filmes muito específicos e muito populares que não viajam para fora do país, ninguém consegue se sustentar pelo mercado. Apenas 3% dos filmes lançados se pagam totalmente, seja ele nacional ou estrangeiro. Vale dizer que Hollywood abrange 80% da fatia do mercado mundial”, explica Paulo César Almeida, cineasta e diretor do site Filme B.
“Só se conseguiu viver do cinema nos anos 80 quando não existia tv a cabo, youtube e outras coisas. Hoje o mercado de cinema serve para os atores como uma vitrine, e para os diretores é uma busca de sucesso e realização pessoal. Se eu estivesse nos EUA já estaria aposentado e rico morando em Beverly Hills. Hoje estou em busca de fazer um projeto que me cative, que eu acredite que vai interessar às pessoas. Um projeto que se justifique. Que tenha importância cultural. Se não for assim prefiro ficar quieto”, diz o diretor que foi o primeiro a filmar com HD no Brasil e acumula o saldo de 10 milhões de espectadores.
Para o diretor do premiado filme Dois Filhos de Francisco, Breno Silveira, “este é um verdadeiro momento de retomada, uma retomada de público, retomada de uma boa fase. Foram 15 anos em que o cinema praticamente ficou longe do público, e não é justo. O nosso público precisa se ver retratado, ter as suas histórias contadas. A gente tem uma diversidade cultural muito grande, eu acredito que venha desta nossa cultura miscigenada, isso produz uma riqueza. Às vezes até fico comparando com o cinema argentino que é bom, vive um bom momento, e acho que o nosso é mais rico, temos mais opções, roteiros diferentes, boas histórias”.
Como sócio da Conspiração Filmes, Breno afirma que “produzir filmes ainda é muito difícil no Brasil, são muitos caminhos, trâmites, é tudo subsidiado. A parceria internacional é um ótimo caminho, mas a gente tem outro problema, o idioma. O português é uma língua linda, mas é limitada. É pouco falado no mundo e muitos povos não estão acostumados a ver filmes com legenda. Até me falaram quando Dois Filhos de Francisco foi indicado como filme candidato ao Oscar, que se eu tivesse filmado em espanhol teria conseguido. Com tudo que já conquistamos ainda temos apenas 10% de bilheteria. Na França era assim e hoje eles conseguiram chegar a 40%. Acho que as parcerias com empresas e TVs podem ajudar, ainda são poucas as parcerias (a Globo filmes é parceira em 90% das produções nacionais). Ainda é um esforço viver de cinema no Brasil. Metade do meu dinheiro vem da publicidade. Você leva praticamente 4 anos para fazer um filme e nesse tempo precisa viver de outra coisa. Eu usei a publicidade para bancar o meu sonho de cinema”, completa Breno que estudou fotografia de cinema na França.
Breno viu o seu filme Dois Filhos de Francisco ser duramente criticado na primeira semana de exibição.
“Foi um filme muito difícil. Houve muito preconceito no começo, ninguém acreditava porque era uma história de música sertaneja. Eu cheguei a pensar que tinha errado, mas eu acreditava na história. Foi difícil até arrumar parceiros, patrocinadores, quando viam o projeto todo mundo falava, só vai atrair os fãs e quando saiu pensei, nem os fãs tão vendo, nem quem não é fã. Todo mundo recusou e depois foi aquele sucesso, foi uma surpresa. Agora é mais difícil fazer outro filme, vem a cobrança, mas eu sei que Dois Filhos foi um caso único. Eu gosto de falar de relacionamentos, de laços de família. Eu não sabia e descobri com Dois Filhos, o meu trabalho é emocionar, eu faço filme para emocionar as pessoas”. O seu próximo filme, Era uma Vez, estréia dia 25 de julho.

Breno Silveira e os protagonistas de Era Uma Vez

DESAFIOS
Mesmo vivendo uma boa fase, o cinema ainda oferece grandes desafios e concorrência para os profissionais que querem viver desta arte. A jovem atriz de 19 anos, Sophia Reis, começou no filme Meu Tio matou um cara e conta que “o primeiro papel veio naturalmente”.
Paula Lavigne, amiga do seu pai Nando Reis, a avisou sobre os testes e Sophia foi fazer. Ela foi aprovada e fez a personagem Isa. Meu tio matou um cara é uma comédia policial de 2004, com a direção de Jorge Furtado, reconhecido pelo seu documentário muito premiado "Ilha das Flores".
Recentemente ela filmou como a personagem Bia no curta-metragem Vida e Morte de Sophie Alice, com direção de Vitor Leite e participação especial de Antônio Fagundes.
Sophia explica que "viver de cinema não é nada fácil, não são muitos os papéis, há muitas pessoas concorrendo. É uma provação constante, muitos testes, às vezes até 4 por semana. Essa necessidade de se provar constantemente é cansativa e estressante. Mais uma dificuldade para quem está começando”.
Fora o curta-metragem, Sophia começará em agosto a fazer faculdade de cinema com a vontade de conhecer tudo, de direção à produção. Enquanto não surge um próximo desafio no cinema, a atriz apaixonada por cinema é VJ na MTV.

ANTOPROFAGIA
O cinema cresce, a oferta de profissionais qualificados aumenta, e salas de exibição são aprimoradas. A inclusão de salas multiplex trouxe qualidade de som e imagem, um novo conceito de cinema. E por incrível que pareça, o número de salas não aumentou muito nos últimos cinco anos. Quando uma grande sala de cinema é inaugurada, automaticamente as pequenas que estão à sua volta fecham. Hoje são 2.150 salas espalhadas por todo o país, atendendo às necessidades de um mercado que movimenta R$ 100 milhões por ano.
Paulo César Almeida conclui dizendo que “trata-se de um processo antropofágico. O vídeo comeu o cinema, a pirataria comeu o homevideo e a televisão rouba um pouco de tudo isso. As vídeo locadoras estão falindo e, com a chegada do digital, muda tudo outra vez. Nos próximos anos tudo vai mudar. Eu sempre acho que é pra melhor, eu sou otimista”.
Só uma coisa não vai mudar, temos motivos de sobra para prestigiar o trabalho dos nossos cineastas.

OS PREMIADOS
Em 2002 foi fundada a Academia Brasileira de Cinema, com o objetivo de promover, preservar e divulgar o cinema nacional. A criação de um prêmio para celebrar a produção anual de filmes, marcou o início de um projeto que aproximou mais de 300 sócios, entre realizadores, distribuidores, produtores, exibidores, técnicos, atores e outros profissionais do cinema e audiovisual.
Na entrega do Grande Prêmio Brasileiro de Cinema deste ano, que aconteceu no dia 15 de abril, no Rio de Janeiro, o filme Tropa de Elite de José Padilha, foi o que mais ganhou estatuetas. Nove no total: melhor direção, melhor ator, melhor ator coadjuvante, melhor direção de fotografia, melhor maquiagem, melhor montagem ficção, melhor som e melhor efeito especial. Além de ser eleito pelo voto popular como o melhor longa-metragem nacional.
Tropa de Elite levou mais de 3 milhões de espectadores ao cinema, repetindo o sucesso de Cidade de Deus, de Fernando Meirelles, em 2002. O Ano Em Que Meus Pais Saíram de Férias, de Cao Hambúrguer, subiu ao palco três vezes, uma delas para receber o prêmio de melhor longa metragem de ficção de 2007.
O Cheiro do Ralo, que conta com a atuação de Selton Mello e direção de Heitor Dhalia, ganhou destaque com o prêmio de melhor roteiro original pela adaptação do livro O Cheiro do Ralo, de Lourenço Mutarelli. Na festa do cinema brasileiro, houve espaço até para melhor filme de celular que teve But como o vencedor.
Para a entrega do próximo ano, o filme Meu Nome Não é Johnny será um forte candidato. O longa-metragem foi rodado em 55 locações diferentes, contou com 1.500 figurantes e teve orçamento geral de R$ 6 milhões.
"Na maior parte do tempo, não passávamos mais de um dia em uma única locação. O João nunca fica no mesmo lugar e só pára quando vai preso. Esta movimentação no cinema costuma ser sempre caríssima. Mas conseguimos aproveitar a verba da melhor maneira possível. Tenho muito orgulho da equação econômica do filme", declara a produtora Mariza Leão no site da Academia de Cinema.
Mariza conta também que “as filmagens em Veneza tiveram até um episódio engraçado. Depois de um dia inteiro de filmagem, com todas as dificuldades de logística que a cidade tem, o câmera disse que teriam que fazer tudo de novo porque tinha entrado um pêlo na lente”. Tanto sufoco valeu a pena. Lançado em 2008 o filme Meu Nome não é Johnny, de Mauro Lima, já registra mais de 2 milhões de espectadores.

A nova face do luxo.

Matéria publicada na Revista L'uomo Brasil Maio/Junho 2008.

São Paulo agora tem um novo endereço luxuoso: o Shopping Cidade Jardim. Inspirado nas ruas mais elegantes do mundo, ele não é mais um shopping. É o primeiro shopping aberto da cidade, com marcas exclusivas, lojas posicionadas em frente a belos jardins e estrutura semelhante ao famoso Bal Harbour de Miami.
Por Bianca Moretto e Viviane Lopes

Com inauguração prevista para este mês de maio, o Shopping Cidade Jardim é um investimento único e sem precedentes no Brasil. A começar pelo projeto arquitetônico de Arthur Casas, e paisagístico de Maria João D'Orey. São três pisos voltados para áreas abertas, que abrigam as melhores marcas, opções de lazer, cultura e bem-estar. O shopping inclui até um spa, o Spa Cidade Jardim, o maior da América Latina com 2.500m2, equipado com o que há de mais moderno e eficiente quando o assunto é beleza e estética.
O shopping que tem 120 lojas na fase inicial – com previsão de 180 na final –, está localizado na Marginal Pinheiros e faz parte do complexo Parque Cidade Jardim. Um espaço de 72.000m2, que além do shopping tem nove prédios residenciais e, futuramente, três edifícios comerciais.
O novo centro de compras reúne as melhores grifes internacionais como Armani, Chanel, La Perla, Lacoste, Louis Vuitton, Montblanc, Tiffany, Zara e Zegna dentre outras. Algumas pela primeira vez no Brasil, como Furla, Gant, Longchamp, Rolex e Sony. Dentre as nacionais, Daslu, Ana Rocha e Appolinario, Balangandã, Beach Hall, Carlos Miele, Cris Barros, H. Stern, Juliana Scarpa, Paramount, Reinaldo Lourenço, Tabacaria Caruso, Tania Bulhões, Ventura, as cariocas Lee Loo e Mara Mac e muito mais. Isso sem falar nos serviços e opções gastronômicas como os restaurantes Kosuchi, Nonno, Rugero do grupo Fasano, a doceira Pati Piva, Nespresso, etc.
O projeto concebido há três anos pela JHSF, teve desde o início a consultoria de Carlos Ferreirinha, um dos mais importantes consultores de luxo do país.
Segundo ele: "o mercado, que movimentou US$ 3,9 bilhões no último ano, cresceu 17% e tem espaço para crescer mais." E com o novo shopping "ganha o mercado, ganham as operações e ganharão os consumidores. O Cidade Jardim é o primeiro shopping 100% conceituado e projetado no negócio do luxo, por si só uma novidade e um ineditismo no Brasil."
O empreendimento não vem para fazer concorrência direta com outros endereços conhecidos da cidade. Na opinião de sua diretora, Sharon Beting: "Ele não fará concorrência à Daslu, tanto que a marca contará com uma das lojas-âncora do shopping. Além disso, tanto em relação ao Shopping Iguatemi quanto à Daslu, há uma espécie de barreira, de limite, que é o Rio Pinheiros. Os dois ficam de um lado do rio e nós ficamos do outro."
Ferreinha complementa: "o mesmo consumidor pode comprar nas 3 operações com manifestações distintas de consumo. Também existirão consumidores diferentes, novos, surgindo."
A diretora Sharon ressalta: "o consumidor poderá contar com o diferencial de o shopping ser aberto, encontrar lojas que foram selecionadas de maneira muito criteriosa e serviços que visam a facilitar a sua vida, como: bancos, lojas de operadoras de celular, lavanderia, pet shop, concierge, etc.".

Perspectiva artística da fachada do Shopping Cidade Jardim.

Para os lojistas o investimento promete ser um ótimo negócio, afinal "a idéia do shopping não é atender apenas o público da região, mas sim atrair pessoas de toda a cidade. O lojista contará com um grande número de consumidores potenciais, um fluxo anual estimado em 10.800.000 visitantes, o que dá uma média de 30 mil pessoas/dia. Além disso, o shopping será praticamente o único centro comercial da região.", completa a diretora.
Uma das marcas que compõem o mix de lojas, a MontBlanc, desde 1992 no Brasil, abrirá no Cidade Jardim a maior boutique da América Latina, com mais de 200m2. A negociação começou logo no início da abertura dos espaços, que foram muito disputados pelas marcas. A competição valeu a pena e a Montblanc conseguiu um espaço privilegiado.
A loja terá um conceito para o espaço masculino, o tom ashvenir – madeira azul –; para o feminino, 30 a 40% da loja, madeira maple. Ainda haverá uma sala Vip à portas fechadas para quem quiser marcar horário. O projeto é da matriz alemã e a boutique será inaugurada dia 4 de junho. Na ocasião acontecerá uma festa fechada, com a presença do diretor comercial mundial e do diretor comercial da América Latina. A marca conta com mais de 3 mil itens em seu mix de coleções: canetas, relógios, jóias femininas, artigos de couro e acessórios masculinos. Para o novo endereço estão sendo preparadas novidades que ainda não foram divulgadas.

CASA DO SABER
Uma outra novidade do Cidade Jardim é a unidade cultural da Casa do Saber. Um centro de cursos livres na área de humanidades, que desenvolve projetos culturais e tem como público profissionais liberais, com formação universitária e um interesse comum por cultura e temas contemporâneos.
A Casa do Saber é formada pela sociedade dos profissionais: Maria Fernanda Cândido, Ana Maria Diniz, Celso Loducca, Gabriel Chalita, Jair Ribeiro da Silva Neto, Luiz Felipe D’Ávila e Pierre Moreau. A nova unidade foi um interesse comum entre a Casa do Saber e o Shopping Cidade Jardim.
O shopping queria agregar a qualidade dos cursos à suas lojas, e a Casa do Saber buscava diversificar seus locais de atuação. A terceira unidade da Casa do Saber contará com um espaço de 200m2. Apesar de cultura não ser artigo de luxo, o preço médio das aulas é de R$ 90,00.

Um empreendimento deste porte beneficia a cidade de todas as formas diz Ferreirinha: "posiciona a cidade e o Brasil no ápice da contemporanidade, educa o consumidor cada vez mais em patamar de exigência e excepcionalidade."

Mas mesmo com este novo império do luxo na capital, Ferreirinha lembra que em relação ao luxo de outras cidades do mundo "estamos muito longe e não se pode confundir consumo de determinadas bases de consumidores brasileiros, com formatação de negócios. Alguns consumidores brasileiros são nivelados de igual para igual a importantes consumidores mundiais. Mas, o negócio em si – o varejo como um todo, ainda está distante. A cultura do luxo ainda é capricho para muitos consumidores. E não somente no Brasil. É um comportamento global para todo tipo de consumo."
O fato é que mesmo que não estejamos em Miami, nem nos endereços mais luxuosos do mundo, agora será possível saciar qualquer capricho de consumo de uma maneira muito mais agradável.

2 de abr. de 2008

Uma paixão para ser vivida nas alturas

Matéria publicada na Revista L'uomo Brasil Mar/Abr 2008.

Quando Santos Dumont voou pela primeira vez no 14-Bis em 1906, certamente não podia imaginar o quanto a aviação seria importante e presente na sua terra natal. O Brasil é hoje o 2º maior mercado mundial da aviação, atrás somente dos EUA. Além disso, abriga uma das maiores fábricas de aviões do mundo, a Embraer. E mesmo que pareça o contrário, atualmente o céu para a aviação é de brigadeiro e de quem mais quiser, e puder, embarcar neste vôo.
Por Viviane Lopes

A aviação comercial brasileira passou por vários momentos difíceis em 2007. Um deles, o mais dramático, foi a queda do Airbus da Tam no aeroporto de Congonhas vitimando 199 pessoas. O episódio atingiu em cheio a opinião pública e a mídia, que já vinha bombardeando a aviação com críticas e uma fiscalização intensa, talvez única na história do setor. Mas enquanto a aviação comercial enfrentava problemas de atraso, acidentes, malha viária congestionada e controladores de vôo sobrecarregados, a aviação executiva alçou vôos cada vez mais altos e não parou de crescer. Nem o medo de voar, nem as constantes polêmicas serviram para arrefecer o ânimo dos apaixonados por aviões.
Em São Paulo, a Eacon, Escola de Aviação de Congonhas é uma prova contundente. A escola registra um aumento constante no número de alunos interessados em pilotar. O instrutor de vôo Andrei Bertollucci conta “de 98 pra cá, tivemos um crescimento absurdo. Antes era uma casa com quatro salas de aula, hoje temos duas edificações. Já chegamos a operar em Brasília, Curitiba, Sorocaba, Santos, Porto Alegre e temos mais de 1.000 alunos. Crescemos cerca de 400%". Apesar do crescimento constante, o número de mulheres ainda é menor e corresponde a 20% do total de alunos.

PILOTO APRENDIZ
Os cursos oferecidos atendem quem quer pilotar seu próprio avião ou ingressar como piloto no mercado de trabalho. Nos dois casos, o aprendiz começa escolhendo entre ser piloto de asa fixa, avião, ou piloto de asa rotativa, helicóptero. O pré-requisito é concluir o curso de piloto privado e ter a idade mínima de 17 anos, além do primeiro grau completo. A carteira definitiva de um piloto só sai aos 18 anos e o curso base tem uma duração aproximada de 4 meses, de segunda à sexta, ou 6 meses em período integral nos sábados. Há uma prova teórica na ANAC e uma instrução prática de no mínimo 40 horas, para obtenção do primeiro certificado.
Mas o curso base habilita para pilotar apenas aeronaves de pequeno porte e em condições meteorológicas favoráveis. Para pilotar aeronaves de maior porte, o aluno precisa fazer novos cursos e acumular horas de vôo. Como explica Andrei "cada um opera com um tipo de avião, e para cada avião que o piloto for voar ele precisa fazer um Ground School, um curso de 80 horas de teoria. Depois começa a operar a aeronave como co-piloto em instrução até totalizar o número de horas de acordo com a homologação da empresa. Só então faz um novo check e obtém a licença para aquela aeronave específica." Problemas de saúde como, por exemplo, algum problema mais sério de visão, podem ser empecilho. Sinusite aguda e desvio de septo também são problemas quando se precisa voar em um avião pressurizado. Quem tem mais de 40 anos precisa de um check-up a cada 6 meses. Os mais novos fazem um a cada ano.

Perdigueiro do jornalista Juca Fernandes.

PAIXÃO POR VOAR
Mas a paixão por voar não é exclusiva de quem deseja ser piloto. Antonio Carlos Juca Fernandes é jornalista, 46 anos, e voa desde os anos 90, quando escrevia para um grande jornal que decidiu formar um piloto para ter um profissional especializado. Foi quando Juca se deparou com aquela que seria sua nova e definitiva paixão, que culminou na revista especializada Freqüência Livre.
O primeiro avião foi um monomotor chamado Aeroboero. Hoje o Perdigueiro – apelido carinhoso dado por Juca – laranja e com focinho de cachorro, é o seu verdadeiro carro. “Vou pra todo canto que tenha uma pista de pouso. No Brasil sou facilmente encontrado na Baia de Angra dos Reis, no Hotel Portobello. Tenho um Piper Corisco fabricado pela Embraer, com capacidade para acomodar quatro ocupantes. Meu avião tem autonomia para voar mil quilômetros, então com frequência vou até os países da América do Sul”.
A paixão é tão grande que Juca não tem mais divisão entre trabalho e divertimento. E ressalta o lado bom: “Vou para lugares maravilhosos e me relaciono com pessoas especiais. Acabei conhecendo boa parte do mundo por conta da minha profissão de jornalista de aviação”.
Apesar da experiência, Juca conta que às vezes sente medo voando, principalmente quando a natureza está enfurecida. E por duas vezes correu riscos quando ficou sem combustível: “em uma delas pousei seguramente na Castelinho Branco em Sorocaba, sem grandes problemas. Noutra pousei em Betim, Minas Gerais com alguns problemas”.
Para os iniciantes, que ainda não tem seu próprio avião, Juca conta que “é possível alugar aviões e a aviação não é tão cara quanto parece”. Além disso “um avião usado não custa muito mais que um bom carro importado”.

Phenom 100 da Embraer.

JATOS EXECUTIVOS
Para os que sonham com o seu avião particular e novo, o sonho pode estar cada vez mais real. A Embraer, empresa brasileira fundada em 1969, compartilha os bons ventos do setor e em 2001 começou a investir na produção de aviões executivos. Foram 169 aviões entregues no último ano, incluindo mais de 30 jatos executivos. E já são mais de 18 bilhões de dólares em pedidos confirmados, trabalho suficiente para os mais de 20.000 funcionários ficarem ocupados até 2013.
O primeiro jato foi o Legacy 600 com capacidade de 13 a 16 pessoas, sem contar os pilotos, lançado em 2001. Recentemente a Embraer lançou os modelos Phenom 100, jato muito leve, Phenom 300, jato leve e Lineage 1000, jato ultra large. São jatos para todos os públicos e necessidades e todos produzidos pensando no conforto máximo do comprador. A linha Phenom por exemplo, teve o seu interior projetado pela BMW. O projeto leva em conta o bioalcance, uma preocupação em fazer da máquina uma extensão confortável para o corpo de quem usa o avião. Por exemplo, as pernas do viajante que ficariam encurvadas em outro avião da categoria, no Phenom ficam na posição correta evitando o desconforto mesmo que a viagem seja curta.
A equipe da L´uomo Brasil, que visitou a fábrica e pode conferir a produção dos jatos, verificou como a decoração do interior é feita. O comprador escolhe as cores, carpetes, poltronas, madeiras, enfim tudo e pode ver visualizar o interior do jato decorado num projeto virtual. No caso do Legacy, o avião vem com cozinha, uma área de trabalho, TV de LCD, banheiro e o que mais o cliente quiser. A ambientação é decidida no decorrer da produção, assim como a pintura externa que é feita de acordo com a vontade do cliente, seja básica ou extravagante. O Lineage 1000, muito maior, conta até com chuveiro para um banho nas alturas. Nele os ambientes se multiplicam e é possível separar sala de trabalho, descanso, sala de assessores e empregados, cozinha e tudo que o cliente sonhar.
Tanto luxo tem um preço alto. Mesmo assim quem comprar um Legacy 600 hoje terá de esperar no mínimo 18 meses na fila para a entrega. Por este motivo, o jato usado custa o mesmo preço de um novinho, algo em torno de 26 milhões de dólares.
Na hora de adquirir seu avião executivo, o processo é simples, mas diferente da compra de um veículo onde há uma loja para o consumidor chegar e escolher o produto. Neste caso, o interessado deve acessar o site da empresa e contatar o departamento de vendas. Depois é só agendar para conhecer o produto e agendar um vôo antes de escolher. Quem comprar o jato também não precisará se preocupar com a manutenção e encontrará lugares próprios para isso em vários lugares espalhados estrategicamente mundo afora.
O jato executivo hoje não é apenas luxo, é mais do que isso. É uma ferramenta de trabalho. Muitos empresários constataram que ter o seu próprio avião é um investimento com retorno garantido. Voar um dia antes para chegar a uma reunião, pode fazer a diferença na hora de fechar um negócio de milhões de dólares e o empresário não pode perder um tempo precioso entre escalas e vôos que atrasam com frequência, situação constante na aviação comercial. Mais um bom motivo para você sair voando.

27 de mar. de 2008

Os sucessores

Matéria publicada na Revista L'uomo Brasil Mar/Abr 2008.

O tempo não pára. Filhos de grandes nomes do mercado nacional, como Ivan Zurita, Rolim Amaro e José Talarico, compõem uma nova geração de empresários que está abrindo concorrência e reciclando idéias. A novidade é que a meta destes sucessores não é ocupar a cadeira do pai. Alguns talentos, lapidados desde o berço, assumiram o risco de abrir a própria empresa e sentir na pele a insegurança do marco zero. A nova geração dorme cedo, é apegada à família e se preocupa com sustentabilidade.
Por Viviane Lopes e Bianca Moretto

Num país em que cerca de 60% da força de trabalho não têm sequer o primeiro grau completo, Bruno e Thomaz Talarico, respectivamente 14 e 13 anos, ganham destaque. Eles estudam em uma escola britânica e já são fluentes em três idiomas.
“Posso dizer que o meu inglês é melhor do que o meu português”, diz Bruno que mora no Rio de Janeiro, mas tem planos de se mudar com o irmão para São Paulo com o intuito de “aproveitar melhor o mercado de trabalho”.
Bruno e Thomaz são filhos de José Talarico, CEO da Pepsico, empresa que hoje ocupa o segundo lugar na indústria de alimentos mundial, com 12 fábricas no Brasil e cerca de 40 mil funcionários.
“Criei os meus filhos com muito diálogo. Invisto em educação e cobro bom desempenho”, diz ele orgulhoso com o título de 2º Melhor Aluno que Thomaz recebeu na escola. “O mundo está tão globalizado que as empresas familiares estão acabando. Se um deles vier a ocupar o meu posto será por mérito. Terão que conquistar a vaga e não apenas me suceder”, conclui o pai.
Bruno e Thomaz são exemplos da nova geração que vem por aí. Por enquanto, eles passam dois períodos na escola e aproveitam o resto do tempo para jogar vídeo game e praticar esportes. No futuro, Thomaz diz não saber se está disposto de abrir mão da qualidade de vida para construir uma carreira.
“Admiro o meu pai por tudo o que ele proporciona para nós, mas não sei se quero ficar longe da minha família e passar por tudo o que ele passou para ter um bom cargo”. O futuro dirá.
Enquanto isso, Marcos Amaro tem 23 anos e é empresário desde os 18. Não se trata de um posto herdado, ou algo do gênero. Quando o seu pai, o comandante Rolim Amaro faleceu em 2001, Marcos fazia estágio na TAM em Marília, empresa que até hoje pertence à sua família. Na ocasião, com apenas 18 anos de idade, Marcos decidiu investir em outro segmento e fundou a Amaro Participações, uma holding de investimentos que atua em dois setores: o agronegócio e o luxo.
A fórmula, segundo ele, “é associar-se a pessoas boas, sempre melhores do que eu”. Um exemplo disso é Carlos Ferreirinha, “hoje, na minha avaliação, ele é o melhor consultor de luxo do Brasil e nos ajuda no desenvolvimento estratégico. Eu o uso, no bom sentido, para lapidar o meu trabalho”, explica Marcos.
Atualmente a WLUX apresenta em seu portfolio quatro marcas de referência no mercado: TAG Heuer, Alain Mikli, Philippe Starck e Mikli. A empresa tem como missão “ser a preferida entre as distribuidoras de produtos de luxo do Brasil”. Marcos se prepara para adquirir uma outra empresa para incrementar o Grupo, cujo nome ele faz segredo.
“Em 2008 quero gerir os meus negócios de maneira cada vez mais assertiva e gerar empregos. Somos uma empresa de investimentos e precisamos ter lucro, mas não vamos abrir mão do lado humano”. Entre os projetos está um programa de reflorestamento que dá retorno financeiro e ajuda na melhoria do meio ambiente.
“Ter estrutura familiar e dinheiro suficiente desde sempre me ajudou, mas se eu não tivesse iniciativa própria não teria dado certo. Acordo às 5:30 da manhã e trabalho cerca de 15 horas por dia, depois disso faço ginástica porque acho importante ter qualidade de vida” – diz ele.
O resto do tempo é para dividir com a família e com os amigos. O jovem empresário comparece apenas em eventos sociais ligados ao trabalho e, no mais, prefere um bom livro. Marcos é ousado e, apesar de ter nascido em berço de ouro, não tem medo de perder tudo e “ter que lavar pratos para sobreviver”.
“Para mim Deus vem em primeiro lugar, fiz terapia por um tempo, mas hoje só a religião basta para manter o equilíbrio e buscar forças. O meu pai passou por muitas dificuldades na vida, foi autodidata e construiu tudo sozinho com muita perseverança.” A herança deixada pelo comandante Rolim foi além do dinheiro. Marcos é um jovem com espírito empreendedor e entende que é preciso “ter coragem com prudência”.
Neste mesmo caminho segue Daniela Zurita, de 29 anos. Ela é a única filha do dono da maior indústria de alimentos do Brasil, a Nestlé. A sucessora de Ivan Zurita tinha tudo para ser uma menina mimada, mas não é. Ela conta que sempre gostou de brincar de vender, e aos sete anos já fazia cartões de natal para comercializar na porta da casa da avó. Daniela começou a sua carreira fazendo estágio na JWThompson do México, país onde concluiu a faculdade de comunicação com especialização em marketing. Quanto aos negócios do pai ela limita-se a organizar o leilão de gados Nelore e Simental, que acontece três vezes ao ano. Depois de morar no Chile, na Argentina, no Panamá, na Suíça e no México, falar cinco idiomas tornou-se um processo natural. Há dois anos ela está de volta ao Brasil e diz estar “acostumada a recomeçar”.
Com rosto de menina e olhar sempre solícito, Daniela consegue ser simples no meio do glamour que a rodeia, inclusive em grandes eventos como o Athina Onassis Horse Show, que ela organizou com sucesso no ano passado e deve repetir a dose em outubro este ano. A DZ Eventos, que ela fundou há menos de um ano, já conta com clientes como a Rede TV, Scala e TV Record.
“Costumo falar que a minha empresa é pequena e continuará pequena. Gosto de acompanhar de perto cada um dos meus clientes. Participo de todas as escolhas e cuido de cada detalhe para que tudo saia como planejado”.
Do pai ela herdou “transparência e honestidade”. Em meio a correria, Daniela ainda encontra tempo para manter em harmonia o namoro de nove meses com o chef de cozinha e apresentador Eduardo Guedes. Somem-se a isso, ginástica três vezes por semana e a leitura do livro “Marley e Eu” para cuidar bem do seu labrador. Haja disciplina.

8 de fev. de 2008

Navegar é preciso, trabalhar também.

Matéria publicada na Revista L'uomo Brasil Jan/Fev 2008.

Vai começar mais um dia de trabalho. Duas coisas são essenciais: o celular e o laptop. Com a tecnologia nas mãos, agora é só vestir uma bermuda e uma camiseta e pronto. Estranhou o clima e a roupa descontraída? Não se surpreenda. Atualmente, esta é a realidade de muitos empresários, e agora poderá ser a sua.

Por Bianca Moretto e Viviane Lopes

Paulo Veloso é um dos felizardos que já pode optar entre trabalhar contemplando o céu e o mar ou permanecer na selva de pedra. A primeira, e muito mais agradável, opção está cada vez mais constante na sua vida. Um dos sócios da empresa Regatta, Paulo convive diariamente com a rotina dos barcos como empresário, mas há algum tempo uniu o útil ao agradável e num veleiro viaja e realiza muitos dos seus negócios “como se estivesse na minha própria mesa, mas a bordo”, diz. Ele e mais dois amigos arrendaram um veleiro 76 pés e percorrem diversos locais da imensa costa marinha brasileira e também do exterior.
Neste veleiro a viagem não se limita apenas ao prazer de viajar, conhecer ou rever grandes lugares, mas também a manter-se ligado com o que acontece no trabalho. A bordo, Paulo fecha negócios, contata pessoas, fala com seu escritório, envia e recebe e-mails importantes e decide novos rumos para a sua empresa. Paulo já percorreu cidades como Ilha Bela, Paraty, Angra dos Reis, Bahia, Natal e muitos outros lugares. Ele passou as festas de final de ano no Caribe e diz que o barco-escritório hoje “não é uma tendência, é realidade.”
Por opção as suas viagens são constantes e curtas, duram em média 1 mês ou 20 dias, mas a tecnologia oferecida a bordo deste veleiro e de praticamente todos os outros barcos atuais, poderia durar meses ou até mesmo ser uma opção definitiva de trabalho.

O empresário Silvio dos Passos no seu barco-escritório, o Matajusi.

MATAJUSI
Prova viva é o empresário Silvio dos Passos Ramos, presidente da Harte-Hanks do Brasil. Aos 59 anos, Silvio conseguiu colocar em prática o Projeto Matajusi. Este é o nome do seu barco-escritório, um RO 400 que foi "modificado para ter mais autonomia e segurança em travessias oceânicas e possui todos os tipos disponíveis de meios de comunicação", conta. O Matajusi tem rádios VHF e SSB, notebooks e handhelds com capacidade de acesso a redes wireless (802.11 WLAN) e GSM. A única coisa que falta, e está sendo providenciada, é a comunicação via satélite, mas isso não é empecilho para o trabalho.
O mais importante é o acesso à internet, pois com ela ocorre a comunicação entre barco e escritório central. Para não ficar sem conexão, o Matajusi tem vários níveis de comunicação, dependendo do lugar e da disponibilidade de conexões. Dentro do barco há rede wireless para logar na Internet, a segunda opção é a rede GSM, quando tem alcance o celular. Silvio também usa um notebook ou uma HP 6945 para se comunicar. Em terra, um internet café, ou mesmo redes wireless ou GSM resolvem o problema. Quando no mar as redes ficam indisponíveis, a opção é o rádio SSB para mandar e receber emails.
O Projeto nasceu da vontade de novas experiências, de viajar ao redor do mundo e conhecer lugares paradisíacos. Mas isso precisava acontecer sem deixar de produzir e ganhar, e um barco-escritório foi a solução. Comprado entre 2006 e 2007, o trabalho ininterrupto para prepará-lo tem sido grande, mas Silvio garante que a recompensa "é o reconhecimento e o fato de estar dando certo a idéia de que se pode trabalhar a bordo de um veleiro-escritório."
A rotina de trabalho é tranqüila de qualquer lugar por onde Silvio navega. Os únicos inconvenientes são encontrar tempo hábil no barco para fazer as conexões, porque como ele conta, "se estivermos com dificuldades na navegação, como áreas perigosas, tempo ruim, e outras razões mais, não podemos estar concentrados nas comunicações. Mas quando temos tempo disponível, podemos fazer qualquer tipo de trabalho que fazemos hoje de casa, ou mesmo de outro escritório da empresa. Minha rotina de trabalho consiste em verificar meus e-mails algumas vezes por dia e trabalhar principalmente a noite."
Em terra, uma assistente transmite o que acontece na empresa e fica atenta a possíveis conflitos, guerras, fenômenos naturais e outras ameaças.
Silvio passou os últimos 3 meses em Santa Catarina, na Baía de São Francisco, e para o futuro a idéia é aprimorar a técnica de trabalho a bordo e dar a volta ao mundo saindo para o Canal do Panamá no final de 2008. Neste momento, Silvio e a sua companheira de navegação, Lilian Monteiro que trabalha no RH e com quem está criando uma empresa de head-hunting, estão percorrendo a costa Norte do Brasil.
Outra idéia é "mudar com o barco-escritório para outros países na América do Sul, para abrir novos escritórios nesses países." Os únicos temores quanto a navegar são típicos do meio de transporte, como bater em um bando de baleias a noite, ou ser atacado por elas, enfrentar ondas gigantes ou tempestades muito fortes. Nesses casos, a única preocupação é com a sobrevivência do barco e seus tripulantes.
Risco à parte, que sempre existe em qualquer lugar, Silvio confirma que a única inconveniência é "quando não conseguimos conectar por alguma razão. Já as vantagens são inúmeras, vida mais intensa, mais vivida, com mais experiências, mais exposições a bons momentos, lugares paradisíacos, povos amigáveis, outras culturas. Enfim, uma vida muito mais sadia."

Felipe Whitaker fazendo planejamento da rota para a navegação.

OUTRAS PROFISSÕES
Tanta tecnologia não beneficia apenas os empresários. O velejador Felipe Whitaker, junto com Beto Pandiani, manteve contato praticamente diário com o Brasil e o mundo enquanto concluía a última etapa do projeto Rota Boreal. O objetivo era percorrer o trecho entre Nova Iorque e Groenlândia.
O barco, um catamarã EagleCat 21 pés, construído em carbono, foi apelidado de Jangada High-Tech. Além da construção sofisticada, era equipado com GPS, E-track (para localização via satélite), telefones satelitais, VHFs, celulares, placas de bateria solar, notebook, câmeras de video e fotos digitais e à prova d'água.
O conjunto tecnológico os mantinha conectados e o único problema eram as pilhas, que obviamente não são encontradas com facilidade no Pólo Norte. A solução foram painéis solares que mantinham toda a aparelhagem eletrônica ativa. Um alerta de Felipe é que "água salgada e componentes eletrônicos não se entendem bem, portanto é preciso saber manusear corretamente os gadgets para utilizá-los e preservá-los".
A tecnologia, impensável há poucos anos, hoje é vasta e acessível. O experiente velejador pretende embarcar em uma nova aventura até 2010, escalar o Kilimanjaro, na África. Ele, que atualmente usa um veleiro HPE25 e um bote SR15, ambos equipados, dá uma dica: "Estar conectado é questão de sobrevivência no mercado. Fundamental para um escritório é a conexão de internet que pode ser via satélite. Se você for um navegador de longo curso e navega distante da costa, use um celular satelital (GlobalStar). Já se você for um navegador de final de semana, tenha sempre à mão um BlackBerry ou um Smartphone similar, um conector de força para isqueiro ou mesmo um painel solar portátil (de enrolar). Não são equipamentos difíceis de serem encontrados e podem salvar a sua pele, digo a sua carreira!"

INICIANTES
Para quem ainda não usa o barco como escritório, o primeiro passo é deixar o laptop em dia e com a conexão Wi-fi devidamente configurada. Tenha sempre à mão também o Blackberry e se possível, um telefone via satélite. Não há burocracia ou dificuldade de qualquer espécie e as opções tecnológicas são muitas, só é preciso conhecer cada uma delas para melhor aproveitar. Se durante a viagem precisar enviar algum documento ou assinatura, na primeira parada um serviço de entregas rápidas resolve a questão. Hoje em dia praticamente todos os barcos possuem os recursos necessários e quando não, o proprietário vai adaptando conforme a sua necessidade.

INTERNET
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O Descrescimento Sustentável

Matéria publicada na Revista L'uomo Brasil Jan/Fev 2008.

Consumir para ter conforto e tranqüilidade. Resta saber até quando. O que estamos fazendo para que o crescimento econômico seja sustentável? O aquecimento global ganha destaque nas mídias porque deixou o campo das previsões e se tornou realidade, secando rios, destruindo geleiras, confundindo as quatro estações. No século XVIII Jean-Jacques Rousseau questionou o descomprometimento humano “Que ganham, se a própria tranqüilidade é uma de suas misérias? Também nas masmorras se vive em sossego, e é isso bastante para que lá nos achemos bem?”.
Por Bianca Moretto e Viviane Lopes.

“Dado que cada um pudesse a si mesmo alienar-se, não pode alienar seus filhos, que nascem homens e livres; sua liberdade lhes pertence, só eles têm direito de dispor dela”. A frase é do filósofo Rousseau que inspirou a Revolução Francesa. E foi na França que surgiu o Décroissance (decrescimento), que questiona o que sobrará para as próximas gerações. As conseqüências das escolhas do homem atual podem excluir o direito de, por exemplo, água potável para o homem de amanhã.
Os adeptos do Décroissance acreditam que se não pararmos hoje, de produzir desesperadamente, o mundo ficará inviável. “Devemos parar de produzir radicalmente. Parar com a indústria e com os avanços tecnológicos. Já temos produtos demais, carros demais. Não precisamos de mais quantidades e sim de mais qualidade”. A afirmativa está publicada no site do jornal La Décroissance do qual Bruno Clémentin é co-fundador. Ele conversou com a L'UOMO BRASIL por e-mail e disse que esta é uma maneira de começar a pensar sobre reduzir o consumo pessoal e coletivo daqueles que sobrecarregam a capacidade do planeta. Ele explica que não se trata de um movimento: “Décroissance se assemelha ao socialismo logo no início, e não há um líder nem mesmo um presidente”.
Ao todo, 18 mil cópias do jornal são vendidas mensalmente em bancas ou por assinatura. O número ainda é pequeno se considerarmos a população francesa, que gira em torno dos 63 milhões de habitantes. A estatística fica ainda menor quando se trata de aplicar a teoria na prática. “Se for preciso abrir mão do próprio carro, é possível contar o número de adeptos nos dedos das suas duas mãos”, ressalta Bruno.

VETOR DE DEBATES
Líderes políticos e grandes empresários como Nicolas Sarkosy, François Fillon e Jean-Louis Borloo, já declararam repetidamente em programas de rádio e TV que são contra o decrescimento. De fato não seria uma missão fácil puxar o freio da economia de um país, enquanto o mundo todo se preocupa em acelerar as atividades.
“Nós não somos mais inteligentes ou esclarecidos do que os outros. La Décroissance não conseguirá mudar o comportamento humano, ou a maneira como as pessoas agem e reagem, apenas com as palavras. A idéia é simples: quando você sobrecarrega a capacidade da Terra, você deve encontrar maneiras para aprender a continuar vivendo ao mesmo tempo em que reduz o consumo de energia”, diz Bruno.
O jornal La Décroissance entende ser um serviço desta causa, mas não pretende ser um depositário exclusivo. Ele é um vetor de debates e mobilizações para convencer os partidários sobre os impasses do “desenvolvimento sustentável”. Eles se intitulam humanistas, democratas e fiéis à ecologia e a questão social.
La Décroissance questiona, inclusive, o consumo de carne e citam o Relatório Unesco para o Fórum Mundial da Água, de 2004, que revelou quanta água limpa é usada em média, apenas para matar a sede de cada animal. Enquanto um boi consome 35 litros de água por dia e uma vaca leiteira 40, um favelado dos países pobres tem acesso a apenas 20 litros por dia, em média. Eles pedem o fim da produção de agrotóxicos e tem como adepto o José Bové, famoso pela campanha antiMcDonalds.
Uma outra maneira que encontraram para propagar este ideal foi em publicações de especialistas em sociologia, antropologia, economia, filosofia, como é o caso do famoso cientista social Paul Airès. Além disso, há conferências mundo a fora, a última foi no “Grenelle do Meio Ambiente” com a presença dos principais opositores de Sarkozy.
Maria Constança Peres Pissarra, professora de filosofia da Pontifícia Universidade Católica, fez pós-doutorado na França e nos ajudou a entender este ideal ainda tão desconhecido entre os especialistas brasileiros. Ela explica que esta é a idéia de uma nova utopia, uma nova terra de homens felizes com partilha.
"No renascimento o homem passou a dominar tudo o que precisava fazer – idéia de que a ciência poderia resolver todos os problemas, a auto-suficiência do homem. O conhecimento que dá a certeza de tudo o que ele quer fazer. A idéia do belo e perfeito. O único autor no século XVIII que escreveu os problemas do progresso foi Jean Jacques Rousseau. Enquanto todos comemoravam as 'maravilhas do novo mundo', a arte, ele entendeu que produzir a técnica faria com que apenas alguns a dominassem. A partir do momento em que o homem inventou a propriedade, deixamos de viver em igualdade. Após tanto desenvolvimento a Terra dá sinais de que temos limitações e o Décroissance volta no tempo para rechaçar o que é fundamental ao indivíduo. Este é um pensamento a longo prazo, com medidas imediatas. Eles acreditam ser possível e necessário a reconciliação do 'princípio responsabilidade' com o 'princípio esperança'”.

ECONOMIA DE COMUNHÃO
No Brasil um modelo inovador de economia sustentável surgiu há mais de uma década e já mostra resultados práticos nos cinco continentes. Trata-se da “cultura do dar”. Não é filantropia, mas sim, partilha, na qual cada um dá e recebe pelo seu trabalho com igual dignidade. Quando Chiara Lubich propôs a Economia de Comunhão, ela não tinha em mente uma teoria. Entretanto, esta italiana chamou a atenção de economistas, sociólogos, filósofos e estudiosos que lhe conferiram o grau de doutor honoris causa em Economia.
A Economia de Comunhão surgiu em maio de 1991 em São Paulo, durante um encontro de Chiara com a comunidade local dos Focolares, um movimento cristão, do qual ela é precursora, que surgiu após a segunda guerra mundial, no qual se sugere um novo modo de agir com base na partilha.
A pobreza estava presente entre alguns dos 250 mil membros do Movimento, e o que se partilhava com a comunhão de bens já não era o suficiente para manter a estrutura viva e funcional. Daí surgiu a idéia de aumentar a receita, com o surgimento de empresas confiadas a pessoas competentes, em condições de fazê-las funcionar com eficiência para obter lucros.
No entanto, parte dos lucros seria usada para incrementar a empresa; parte para ajudar pessoas necessitadas, dando-lhes a possibilidade de viver de modo mais digno à espera de um trabalho, ou oferecendo-lhes um emprego nessas empresas; e a última parte, para desenvolver estruturas visando a formação de homens e mulheres que motivassem a vida pela cultura do dar, “porque sem 'homens novos' não se faz uma sociedade nova”, explica Luigino Bruni no seu livro Economia de Comunhão – Uma cultura econômica em várias dimensões.
Das poucas empresas pioneiras que em 1991 aderiram à proposta de Chiara, hoje a Economia de Comunhão é uma realidade que engloba mais de setecentas empresas em todos os continentes. Há um espaço, cada vez maior, para debates sobre como conciliar vida econômica e crescimento humano.

A VALORIZAÇÃO DO HOMEM
No Brasil, 121 empresas com 1.098 funcionários já aderiram ao modelo econômico da Economia de Comunhão. Rodolfo Leibholz, é sócio da Femaq uma delas. E mais do que contas e vendas, obviamente necessárias, na verdade o que interessa à empresa, é o “estar bem” das pessoas ao seu redor (colegas, funcionários, clientes, pessoas necessitadas que às vezes nem conheçam e até mesmo os concorrentes) e algo não menos importante, a salvaguarda da própria motivação humana e espiritual. Em particular, há quem entreveja na categoria de “comunhão“ uma nova chave de leitura das relações sociais, que poderia contribuir para superar a postura individualista que hoje prevalece na ciência econômica.
Fundada em 1966, a Femaq é uma empresa que produz peças fundidas em ferro, aço e alumínio, cuja capacidade de produção chega a 30 toneladas de peso unitário, com um faturamento de 38 milhões de reais por ano. Além de atender clientes como Ford e GM, a companhia exporta para cinco países, entre eles, Estados Unidos e Alemanha.
“Sob o ponto de vista do lucro, da acumulação do capital, estávamos na direção certa. Sob o ponto de vista pessoal, passávamos por uma grande inquietação e até uma insatisfação”. "Em 1991, quando Chiara Lubich, fundadora do Movimento dos Focolares, lançou no Brasil o projeto Economia de Comunhão na liberdade, entendemos logo que era justamente aquele o modelo econômico que esperávamos”, conta Rodolfo, que viu o seu faturamento dobrar na última década.
Para se adequar ao projeto, a companhia deve ter resultados financeiros positivos, respeitar o meio ambiente, se integrar com a sociedade, priorizar a comunicação interna e externa, desenvolver um melhoramento contínuo através de pesquisa, ter harmonia e equilíbrio e ser fiel e comprometido com a missão da empresa. Com a Economia de Comunhão, Chiara tocou no ponto chave da cultura econômica, isto é, naquilo que se refere à visão do homem que age na economia, chamando pelos estudiosos como Homo economicus.

7 de fev. de 2008

Anne Sophie Pic, a mulher estrelada.

Matéria publicada na Revista L'uomo Brasil Jan/Fev 2008.

Nos dias 4, 5 e 6 de dezembro, cerca de 90 pessoas por dia, investiram 350 reais para degustar do menu de seis tempos preparado pela Chef Anne Sophie Pic. O jantar aconteceu no restaurante francês Eau, localizado no Grand Hyatt São Paulo. Foi lá que a Chef autodidata, de 38 anos, falou com a exclusividade à L’uomo Brasil.

Por Viviane Lopes e Bianca Moretto
Com colaboração e tradução de Marie Oceane Borba

Em sua primeira passagem pelo Brasil, Anne se diz surpresa com o tamanho e as infinitas construções da cidade de São Paulo, “aqui você sente que chegou em um país latino, com seus lados bons e ruins.“
Ela ouviu de outros chefs franceses que “o Brasil é incrível porque tem uns produtos lindos“ e disse que antes de retornar ao seu país pretendia jantar com o reconhecido chef Alex Atala, com quem se encontrou na Espanha.
“Eu quero conhecer a comida dele. Alex cozinha somente com produtos brasileiros e isso é fabuloso! Eu gostaria também de conhecer as especiarias da Amazônia, as frutas brasileiras e degustas a comida temperada e picante do Nordente".
Apesar do encantamento com a nossa cultura, para o jantar oferecido no Hyatt, Anne quis reproduzir a sua cozinha. Para não correr riscos ela trouxe belas trufas, aproveitando que a temporada por lá acabou de começar. O cardápio começou com uma crême brulée de foie gras com maçã verde, depois vieiras com trufas e rum. Em seguida um barbo (peixe) caramelizado. O prato seguinte foi uma poularde, uma ave levemente perfumada ao iodo, com bulots (uma concha marinha comestível) e batatas. Para as sobremesas, duas opções: uma preparada com o chocolate do Val du Rhône, trazido da França e a outra feita de maçã e champanhe.
Natural da região francesa de Rhône-Alpes, Anne Sophie é filha e neta de chefs que em algum momento também receberam a classificação máxima do Michelin. Somente este ano, ela recebeu dois dos principais reconhecimentos que um chef pode almejar: três estrelas no Guia Michelin – a classificação máxima da “bíblia” da gastronomia – e o título de Chef do Ano 2007 na França, concedido por um conclave formado pelos principais chefs em atuação no país que é destino gastronômico número 1 do mundo.

CAMINHOS
Para conquistar este lugar, a caminhada foi longa e cheia de desafios. Anne intitula-se uma autodidata.
“Tenho um olhar muito humilde quanto ao meu começo de carreira porque, apesar do histórico familiar eu não sabia cozinhar e tudo foi complicado. Meu universo era somente o restaurante da minha família e precisei ir para muito longe para perceber o quanto eu sentia falta daquele que já era meu caminho. Não acredito em acaso na vida; acho que as coisas, se tiverem que acontecer, acontecem”.
Atualmente, Anne conta com a ajuda do marido que trabalha com ela. Esta foi a maneira que encontrou para dividir as funções entre a Maison PIC, o bistrô Le 7 e o hotel.
“Eu me organizei de tal maneira que hoje tenho uma equipe bastante homogênea. O que importa para mim não é estar presente no processo de A a Z, porque as pessoas fazem tão bem, ou melhor do que eu. O que realmente me importa é a criação dos pratos, e neste momento sempre estou com a minha equipe."
O restaurante, o bistrô e o hotel ficam na beira desta mítica, estrada que até 40 anos atrás era o único caminho de Paris para a Côte d'Azur.
“Queríamos ter esta ligação com o passado, mas estamos sempre com o pé no futuro. Agora temos um projeto que é muito importante para nós: a abertura da escola de cozinha, que vai se chamar Scook. Ela ficará a 100 metros do restaurante e terá um lugar de degustação e de arte floral. Eu vou dar aulas e a equipe será formada apenas por mulheres. Acho isso muito bom, já que o meio da culinária é muito masculino."
Apesar da predominância masculina, Anne Sophie acredita que na cozinha deve haver uma complementaridade entre homens e mulheres. Nos seus empreendimentos não há rivalidade. As mulheres são tão bem pagas quanto os homens.
“Se uma mulher for tão competente quanto um homem, ela subirá da mesma maneira e os outros aceitam isso. Eu tenho orgulho disso porque quando cheguei a este trabalho, não era exatamente assim”.
Anne era a filha do chef, não sabia cozinhar e é autodidata, motivos que geravam um ambiente hostil a sua volta, mas com a chegada dos prêmios ela adquiriu serenidade.
“Durante muito tempo me culpei por ser uma mulher neste meio. Graças a estas recompensas, tudo mudou. Eu posso focar hoje no que mais gosto e não tenho mais este sentimento. Quando o senhor Jean-Luc Naret, diretor geral do Guia Michelin, anunciou o Palmares deste ano, ele disse que esperava que a minha vitória suscitasse vocações. E eu também espero, pois sou a prova viva de que isso pode acontecer! Na França, não há muitos autodidatas, ainda é um meio cheio de regras. Não é especialmente negativo, mas o que tem de positivo na cena gastronômica francesa é uma grande diversidade, isso é que faz a sua riqueza. Quase toda a minha geração foi recompensada. Fomos todos recompensados ao mesmo tempo: Yannick Alleno, Pascal Barbot, Frederic Anton... e tem toda uma geração que está chegando. Eu acho a gastronomia francesa muito viva e audaciosa também. Hoje em dia há mais jovens abrindo seu próprio negócio do que em outras épocas”.
Anne Sophie evita definir a sua cozinha com o termo terroir: “Quando se vive numa região, gostamos de nossos produtos, mas meu pai trabalhava muito com crustáceos e peixes que não são especificamente da nossa região. Tento me afastar um pouco do termo terroir, mas a base da cozinha possui os mesmos os valores da cozinha do passado. Acho importante permanecer assim. As associações de sabores podem ser originais, mas tem toda uma parte clássica da cozinha que tem de continuar”.
Para o jantar do Hyatt a harmonização de vinhos da região Cotes du Rhône era feita pelo sommelier Denis Bertrand. Um detalhe que Anne considera muito importante.
“Hoje em dia gostaria de melhorar esta cultura em mim. Trabalho com excelentes sommeliers, que, muitas vezes provam os pratos que preparo. Recentemente, tive a oportunidade de fazer uma degustação com uma das minhas melhores amigas, Christine Vernay, que é do vinhedo do Condrieu. A gente provou um Condrieu com um fígado que eu tinha feito com pêssego.
Em outra vez, saboreamos uma moleja de vitela com cenoura e lavanda, junto com um Côte Rôtie foi uma bela associação, na qual o prato revelava o vinho e o vinho revelava o prato".
A chef disse ainda que tem interesse no trabalho de texturas e que no Japão – local onde esteve recentemente – descobriu o kuzu, um agente de ligação pouco conhecido na França.
"Eu sei muito bem que existem produtos que não vou poder importar para a França, porque são bons no país de origem, mas não mantém a qualidade quando chegam a outros lugares. Fora isso, descobri o mundo dos sushis... Temos de abrir um restaurante no Japão. É um sonho, mas a gente pode sonhar, não é?" – finalizou ela.